Garota Infernal: mais do mesmo num embrulho de Halloween

       Quando li no jornal a sinopse do filme fiquei entusiasmado, não com os detalhes do filme em si, mas com o arquétipo mais básico utilizado por Diablo Cody para construir a tema o eterno Femme Fatale, que no mundo dos livros de horror é chamado de Vamp.

         Para os amados leitores que não tem idéia do que seja uma Vamp, direi que não apenas na literatura, mas também no teatro, este é o nome que damos àquela personagem feminina maléfica com uma “colherada” de sobrenatural. São inúmeras as vamps que habitam a literatura, entre eles temos Lady MacBeth, que mesmo distante do sobrenatural, é capaz de produzir arrepios nos leitores como se fosse uma bruxa. Outra, também de Shakespeare é a mítica Sicorax, que surge apenas como um nome enigmático e A Tempestade, peça do velho bardo cujos personagens me fascinam de forma singular.

         Outro bom exemplo pouco conhecido aqui nas terras brasilis é Lady Arabella March, da derradeira novela de Bram Stoker, A Toca de Verme Branco, que creio eu, era o protótipo do autor para um Drácula de saias. Porém a obra sofreu avarias antes de concluída, em parte devido ao estado de saúde devastado de Stoker, já no fim da vida. Lady Arabella, com seu charme ofídico, porém atrapalhado está entre minhas vamps preferidas.

         Há tantas outras que poderiam ser citadas: Carathis, a megera mãe do Califa Vathek, da novela diabólicamente divertida Vathek de William Beckford; Alraune de A Mandrágora e para finalizar e seguir em frente termino com Ayesha de Henry Haagard Ryder, deusa-bruxa, uma Afrodite humana, eternizada nas páginas de Ela.

         Bem, mas onde ficaria a personagem de Diablo Cody, nesse hall? Da minha parte ela nem entra, mesmo se for convidada. O filme é um grande lixo, seu nome deveria ser: Como Destruir uma Ótima Idéia e Cinco Seções, pois é isso que tanto Diablo Cody, a criadora, como o diretor fazendo. A Sra. Cody deixar evidente, sua preguiça em dar arremates ao roteiro, ele frouxo, banal e prima por aqueles recursos, que até qualquer um de nós já aprendeu de tanto ver filmes de horror teen moveis.

         Porém de toda essa falta de zelo, o que mais me irrita é sua preguiça, não fosse, isso este filminho adolescente gozaria do mesmo prestígio de Pânico. A idéia de uma menina bonita, porém vazia que é assassinada num ritual de magia negra que deu errado e volta à vida fazer repasto dos seus colegas de ginásio é um pequeno diamante bruto. É daquelas idéias sobre as quais pensamos: Droga porque não pensei nisso antes?

         Mesmo assim, não passaria de uma bobagem se, quem quer que tivesse pensado nela antes da Senhorita Cody, tivesse feito o mesmo. E o pior de tudo isso é que uma obscura escritora chamada Audrey Nixon e ponto, porque nada mais se sabe dela, nos brindou com um movie tie-in book, isto é, um livro feito do filme, que não só manteve os defeitos do roteiro, como ainda os tornou mais evidentes.

         Geralmente quando me arrisco a ler um tie-in book, creio que ele poderá fazer duas coisas: tornar a história do filme melhor do que já é ou então salvá-la para a posteridade na literatura. Entretanto, no casa de Garota Infernal a primeira opção dependia fundamentalmente da segunda que não vingou. E isso aconteceu porque seguindo os passos de Diablo Cody, essa tal Audrey Nixon (cujo sobrenome é bem apropriado) apenas reescreveu o roteiro retirando as indicações de corte de cena, close e abertura de plano. Isso qualquer um pode fazer! Tenho certeza que os esboços dessa história estavam na mente de Diablo Cody há tempos, e que no interesse de lucrar com sua fama repentina por conta do bem sucedido Juno, ela pensou antes no dinheiro fácil que ganharia com um roteiro feito às pressas, do que se tivesse guardado e dado tratos a sua obra se esperasse um pouco mais

         E mais uma vez essa bela história teve outra chance e foi jogada no ralo. Tanto Cody como Nixon, poderiam ter explorado os meandros de alguns personagens como Needy e Nikolay. Até mesmo Jennifer poderia ter sido aprofundada em sua superficialidade juvenil. Uma grande amizade entre Needy e Jennifer é sugerida, entretanto, quando Jennifer transforma-se em um monstro faminto essa amizade é varrida do mapa com todos os conflitos em potencial que poderiam advir dela. Os conflitos foram até esboçados, mas não passa disso, tudo fica no terreno do banal e sempre tem uma piadinha adolescente com trocadilhos imbecis para coroar momentos que poderiam tornar-se realmente apavorantes.

         Outro ponto importante que aliado ao tema da vamp teria ficado ótimo se fosse trabalho com mais cuidado e profundidade é o das lendas urbanas sobre as grandes bandas de rock que fazem pacto com o Diabo em troca do sucesso, mas para isso executam todo o tipo de atrocidades macabras. Eventos estranhos assim são sugeridos por muito na carreira de Bob Dylan e das bandas como The Doors e dos Rolling Stones. Tivessem Cody ou Audrey explorado esse tema lhe dando mais colorido, a história teria ganhado vulto se alimentando e alimentando essa lenda, assim como Drácula fez com o mito do vampiro.

         E além disso, mais do mesmo é apresentado para nossa exaustão. As típicas situações e seus personagens típicos: o herói tapado que nunca percebe ou entende nada; uma heroína hiper-sensitiva que sofre da Síndrome de Cassandra; os adolescentes burros e sua estrutura hierárquica do ginásio. Bom eu poderia citar todos os clichês dos quais Wes Crave zombou em Pânico.

         Fico triste, muito triste, porque vejo em Garota Infernal o esboço de uma bela história cheia de vulto sobre estranhezas modernas e o comportamento humano que está em voga nas últimas décadas, que foi arruinada por preguiça e especulação hollywoodiana, depois de ter sido escrita por um bêbado drogado que pensa ser um literato. Mesmo assim eu recomendo: leiam e vejam que tenho razão no que estou dizendo: poderia ter sido e não foi.

Comentários

Postagens mais visitadas